“O ser humano é angústia dos pés às cabeças.
Fala, coloca para fora seus pensamentos e seus sentimentos, que a angústia passa!”
A Frase inspiradora do dia – extraída de um diálogo entre pai e filha no filme indicado no post abaixo.
Minha dica de cultura, dica de cinema de hoje vai para o filme :
“Como Nossos Pais”
Leia um breve resumo comentado da história do filme, a partir de trechos do seu trailer:
Fecham-se as cortinas.
Uma família composta por oito pessoas, a maioria mulheres aparece almoçando numa bela mesa posta ao redor de um lindo e florido jardim.
Todos aparentemente sorridentes e festivos, até que um pé d´água cai de repente e obriga todos a entrarem correndo para dentro de casa.
Enquanto alguns recolhem os pratos e os talheres, o genro casado com Rosa, a filha da senhora dona da casa, puxa as filhas pequenas de volta para a chuva e eles ficam pulando a dançando o que parece uma dança da chuva do lado de fora.
O genro depois aparece lavando a louça na casa da sogra, para espanto e crítica da esposa dele, que reclama dele não repetir aquele gesto em casa.
Além de criticar o marido, Rosa fala em tom grave com a filhas : “-meninas, quando o pai de vocês acabar de lavar a louça a gente vai”, pedido rapidamente rechaçado pelas garotas que manifestavam vontade de ficar mais ali naquele ambiente.
Tudo isso é um prenúncio da história do filme, a história de Rosa, uma filha, uma mãe, uma esposa que mais parece um recheio de sanduíche no meio de todos os outros personagens, levando mordidas por todos os lados.
Rosa está passando por uma crise e entra em conflito com todo mundo, com a mãe, com as filhas, com a cunhada e com o marido. Rosa está agressiva e defensiva e ao longo do desenrolar do filme vamos entendendo o porque.
Primeiro, ela tem uma forte discussão com a mãe, que reage da forma mais desagradável contando para todos ali presentes um segredo de família guardado à sete chaves até aquele dia.
A chuva aperta do lado de fora, parecendo querer aumentar o stress e a pressão que Rosa demonstra sentir dentro dela mesma.
A mãe de Rosa reclama que a filha está sendo dura com as netas e a filha rebate dizendo ser mais parecida com o pai do que com a mãe.
Bingo, motivo para uma das maiores crises de toda a vida de Rosa, que a partir da revelação surpreendente aumenta ainda mais o seu nível de pressão interna e de angústia/ansiedade/tristeza e depressão.
As cenas mudam e enquanto Rosa pratica um dos seus diversos papéis diários, o de mãe zelosa preparando o café da manhã e arrumando as filhas para irem para a escola, o marido sai pela sala em disparada carregando uma mala de rodinhas rumo a uma viagem de uma expedição pela causa ambiental que ele defende ardentemente, alheio aos problemas da vida real.
Rosa observa o marido já na rua, entrando no carro e se depara com outra surpresa que aumenta ainda mais a sua decepção e tristeza para com a vida.
Rosa aparece em pé de guerra com a mãe numa discussão densa e forte a respeito do relacionamento entre ela, a mãe e o pai, num momento em que a formação da família é colocada em dúvida.
Enquanto a mãe grita com a filha tentando desconstruir a imagem de bom homem que a filha tem do pai, o velho aparece cabisbaixo sentando no meio filho ao lado de uma pequena mala de viagem.
Mais um problema que está prestes à cair na cesta dos enormes problemas que Rosa tem carregado nos últimos dias.
Crise com as filhas, com o marido, com a mãe e agora com o pai.
Rosa sente como se o mundo tivesse se voltado contra ela.
Rosa procura o irmão alguns dias depois da discussão e desabafa com ele tudo o que está sentindo e percebe o irmão também abalado pelos últimos acontecimentos, fumando que nem um doido no quintal de sua casa.
Rosa chora e se abraça ao irmão.
De volta para casa, dentro do carro ela desaba em prantos enquanto dirige e diz em voz alta para si mesma estar cansada de suportar todo aquele peso e toda aquela carga, revelando ter descoberto que não consegue e não quer dar conta de tudo e pousar de super mulher apenas para impressionar as outras pessoas.
Mais adiante um pouco, no exercício de outro dos seus múltiplos papéis, Rosa aparece chegando atrasada para uma reunião importante para o trabalho, percebendo que não teve tempo nem para se arrumar adequadamente para a ocasião.
Rosa sente a pressão e toma “porrada” de tudo em quanto é lado, do mais infantil ao mais senil no seu círculo de relações.
A coisa piora tanto que Rosa explode numa discussão com o chefe pelo telefone, toma uma decisão de cabeça quente e depois solta o cachorro para cima do marido durante uma d.r. (discussão da relação) improvisada e inesperada para o marido que reage pressionando ainda mais a esposa.
Numa cena mais adiante Rosa aparece novamente discutindo com a mãe sobre o impacto da revelação forte de dias atrás, porém mal tem tempo para discutir e a mãe solta outra revelação ainda mais forte e mais grave do que a primeira, estando agora apenas as duas na cena.
Literalmente Rosa entra em choque e acaba deixando rolar solto as lágrimas enquanto lê um livro de histórias para fazer as filhas dormirem.
A vida tensa da personagem ultrapassa o limite das telas e acaba se alojando dentro da mente dos espectadores que passam a ter compaixão por Rosa, entendendo e se identificando com cada nova situação e nova dificuldade vivida por Rosa.
Rosa aparece discutindo bravo com a filha por causa de uma simples bicicleta dentro de casa e novamente discute com a mãe, desta vez no interior de seu automóvel.
A bola de neve dos problemas da vida de Rosa vai só aumentando de tamanho, de peso e de intensidade. Chegamos a sentir um pouco de falta de ar por acompanhar a valente trajetória de Rosa ao longo da vida.
Não aguentando a panela de pressão em que virou sua cabeça e seu corpo, Rosa procura ajuda médica numa terapia, mas questiona os resultados, mais por culpa própria do que por qualquer outra coisa.
Rosa entre em parafuso, entra em crise, em colapso emocional, desaparece de casa por uns dias para tratar das sequelas da primeira revelação da mãe e volta e abraça bem apertado as filhas, todas morrendo de saudade.
Na rotina diária de levar as filhas de carro para a escola, Rosa esbarra com o destino e encontra ao mesmo tempo um refúgio e uma encrenca que farão transbordar ainda mais a sua dramática situação de vida.
Rosa e mãe aparecem em um novo debate, desta vez discutindo visões diferentes sobre a percepção que ambas tem dos homens que fazem parte de suas vidas.
Num raro momento de encontro de Rosa com seu suposto pai, ela ouve daquele velho, intelectual, lunático, sonhador e quase irresponsável sábios conselhos sobre as angústias da vida.
Em pleno viaduto movimentado do centro de SP Rosa aparece cometendo um ato de transgressão às regras, que apesar de inconsequente mostra a sua revolta com a vida, com o mundo e com as pessoas que a cercam.
Quase no final, Rosa pressiona a mãe contra a parede, para saber toda a verdade em relação às mentiras nas quais ela cresceu acreditando, enquanto a mãe larga um cigarro para tocar um piano, num dos momentos cruciais e mais emocionantes do filme, no que parece uma valsa de despedida.
Gostei do que vi no filme “Como Nossos Pais” – o filme nos é apresentado com um bom livro cuja próxima linha é impossível não querer continuar lendo. Ficamos ansiosos pelas próximas cenas, na espera de novos acontecimentos ao mesmo tempo esclarecedores e criadores de novidades numa relação sem fim.
Como Nossos Pais é um filme inteligente que balança em cima do muro, hora pendendo para o lado da maturidade, hora para o lado da inexperiência com os duros fatos da vida.
Como Nossos Pais explora o triplo papel da mulher moderna, como filha dentro de uma relação complicadamente espinhosa com a sua mãe, supostamente a responsável pela sua formação e parte de suas neuroses; como mãe no papel inverso causando os mesmos tipos de dores, alegrias e sofrimentos para suas filhas, vivendo o dilema e a pressão de ter que parecer mais do que ser uma super mulher.
Excelentes atores, atrizes melhores ainda interpretando fortes e duros papéis, num trabalho muito bem feito, acima dos padrões da média dos filmes nacionais.
Breve análise psicológica e filosófica da história :
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O filme reflete as consequências de algumas das principais dores dos seres humanos, as razões de algumas das sua neuroses não entendidas.
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A começar pelo medo da morte, que parte da negação do mesmo como forma de auto proteção para um fato inevitável da vida.
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Continua mostrando as consequências duras que as pessoas precisam encarar por causa de escolhas bem ou mal pensadas no passado.
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Passa pelo vazio da solidão que vai tomando conta da vida das pessoas à medida que elas avançam no tempo.
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E termina desembocando no eterno questionamento sobre qual é o verdadeiro sentido e propósito da vida.
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Tudo isso é minuciosamente detalhado no interior da mente dos personagens e externalizado pelas suas compulsões incontroláveis, seus sintomas físicos e psíquicos, momentos de instabilidade emocional, um pouco de aventura e um pouco de loucura, passando por demonstrações de vícios e tentativas de se auto sabotar e se auto enganar para fazer a vida ter um pouco mais de sentido, ainda que torto e não reto e linear.
Para sua pré-analise, indico as notas recebidas pelo filme nos maiores sites de cinema do mundo:
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7,4 na opinião de mais de 1000 pessoas no site IMDB
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8,5 em minha opinião pessoal
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8,0 na média das avaliações acima
Veja o trailer :
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